quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Plátanos com manchas? É problema de fígado!

O título é um abuso à rábula de Vasco Santana em «A Canção de Lisboa» que, ao ver uma girafa e fazendo-se passar por veterinário, diagnostica ao tratador do zoo: “estas manchas é problema no fígado, vinte baldes de água a ferver por dia", mas é justificável e aplica-se que nem uma luva ao que tem sido prática comum das autarquias no que concerne ao “tratamento” a dar às árvores; vetustas e de grande porte, claro, sejam plátanos, pinheiros mansos ou eucaliptos. Há até uma guerra declarada ao choupo, tornado indesejável intra-burgo e exilado para as zonas húmidas (isso é evidente no PREC do Príncipe Real), e ao cipreste, exilado para os cemitérios quiçá por tonta superstição (ex. na requalificação do Torel os bonitos ciprestes da entrada foram “substituídos” por … candeeiros de design contemporâneo).

Porquês, chapéus, haverá muitos. Subjectivos: a panóplia de projectos de “restauro” sempre em carteira nos serviços; o potencial mercantil na madeira abatida, empreitadas de arranque e replante de especímenes; os condicionamentos técnicos infra-estruturais, etc. Objectivos: há raros especialistas em podas e demasiados empresários de “desmatações” -vide os desbastes em Monsanto em que à custa das limpezas periódicas necessárias às árvores corroídas por bactérias e fungos, a serra eléctrica rapa mais umas centenas de outras sãs; ou os ex-libris da E.N. Sintra -Colares que só não foram “tratados da saúde” porque houve quem alertasse para a estranheza daqueles plátanos terem sido marcados a encarnado.

Ora, para se acabar com “arboricídios” como o de há 3 anos no Cp. Pequeno, em que cerca de 150 plátanos foram abatidos, sob um manto “diáfano” de índole fitossanitária (atestado a posteriori) que ameaçava fazê-los cair sobre os transeuntes (suponho que todas de uma vez), ou o de há dias aos choupos do Príncipe Real; é bom que as autarquias substituam os Vasquinhos por pareceres escritos abalizados pré-abate, discriminados e sob debate junto da comunidade, sempre que queiram intervir de forma potencialmente intrusiva em jardins, parques ou fileiras de árvores de alinhamento. Conforme os casos, caberão esses pareceres à Autoridade Florestal Nacional e ao Instituto Nacional de Recursos Biológicos, respeitáveis organismos do Ministério da Agricultura, e ao Laboratório de Patologia Vegetal Veríssimo de Almeida, do Instituto Superior de Agronomia. Mas um debate que não seja “para inglês ver”, mesmo que a tentação seja a Lei da Rolha.




In JN/Passeio Público (4/2/2010)

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